segunda-feira, 20 de junho de 2011

Silas "Tetzel" Malafaia


Estava com a intenção de escrever um artigo diferente para esse blog, mas ficará para o mês que vem, afinal, não vou me furtar de pensar, com você, caro leitor, sobre alguns pontos que são necessários dizer!

Esse vídeo aí em cima mostra um suposto pastor evangélico pedindo o DINHEIRO DO ALUGUEL de seus fiéis como oferta em prol de Deus abrir às portas da casa própria! São imagens fortes, estarrecedoras.

Nos Evangelhos nunca vimos Jesus pedir o dinheiro de alguém, nem coisa alguma de ninguém. Quando na multiplicação dos pães e peixes, ele o fez para todos que estavam presentes e com fome. Jesus nunca viu com oportunismo a necessidade do mais pobre como meio de se autofinanciar ou se promover. Jesus não desfilou com limusine em Jerusalém, alugada por 7 mil denários/ dia, nem comprou um avião para anunciar o Evangelho. Gente, ele ia a pé! Ele não adquiriu cavalos, nem carroças, não morou em mansões, e nunca USOU O DINHEIRO DOS QUE NELE DEPOSITARAM A FÉ PARA SEU PRÓPRIO DELEITE.

Jesus é aquele que diz para não ajuntarmos tesouros na terra, e para muitos isso pode parecer loucura, e é! Mas a lógica do Reino não é uma lógica individualista, centrada no eu. Mas uma lógica coletiva, que busca o pobre na sua miséria:

Então dirá o Rei aos que estiverem à sua direita: Vinde benditos de meu Pai. Possuí por herança o reino que vos está preparado desde a fundação do mundo; porque tive fome, e me destes de comer; tive sede, e me destes de beber; era forasteiro, e me acolhestes; estava nu, e me vestistes; adoeci, e me visitastes; estava na prisão e fostes ver-me. Então os justos lhe perguntarão: Senhor, quando te vimos com fome, e te demos de comer? Ou com sede, e te demos de beber? Quando te vimos forasteiro, e te acolhemos? Ou nu, e te vestimos? Quando te vimos enfermo, ou na prisão, e fomos visitar-te? E responder-lhes-á o Rei: Em verdade vos digo que, sempre que o fizestes a um destes meus irmãos, mesmo dos mais pequeninos, a mim o fizestes.

Jesus nunca pediu nada para si mesmo, nem para o Reino, que não fosse à causa do outro, do próximo e do semelhante. O Evangelho que é anunciado, não é o das palavras, mas é do Verbo Encarnado, vivenciado, experimentado. Você pode anunciar Jesus de todos os jeitos, mas, se forem só palavras, então, seu efeito será vazio, desconhecido, inútil:

Então dirá também aos que estiverem à sua esquerda: Apartai- vos de mim, malditos, para o fogo eterno, preparado para o Diabo e seus anjos; porque tive fome, e não me destes de comer; tive sede, e não me destes de beber; era forasteiro, e não me acolhestes; estava nu, e não me vestistes; enfermo, e na prisão, e não me visitastes. Então também estes perguntarão: Senhor, quando te vimos com fome, ou com sede, ou forasteiro, ou nu, ou enfermo, ou na prisão, e não te servimos? Ao que lhes responderá: Em verdade vos digo que, sempre que o deixaste de fazer a um destes mais pequeninos, deixastes de o fazer a mim. E irão eles para o castigo eterno, mas os justos para a vida eterna.

Agora, olhe para esse outro vídeo, desse monge dominicano que viveu em 1517 na Alemanha, Tetzel:




Qualquer semelhança não é mera coincidência! Cuidado, pois querem explorar sua fé.

sexta-feira, 10 de junho de 2011

PENTECOSTES (πεντηκοστή)

O dia cinquenta : “hu hu papai chegou!”

Ao ler Os Evangelhos a Luz da Psicanálise, de Françoise Dolto com alguns amigos em minha casa, tenho percebido a importância dos arquétipos da família para uma hermenêutica possível do Evangelho. Hermenêutica inclusiva por excelência; primeiro porque a própria idéia de família implica em seu sentido mais amplo, no de inclusão, apesar das tentativas fundamentalistas milenares na direção contrária. E segundo porque o Supremo Tribunal Federal, a mais alta corte de nosso país julgou procedente a demanda da comunidade LGBT pela emancipação jurídica na constituição de entidade familiar.

Papai, mamãe e filhinhos assumem a partir da minha leitura desta bela obra a perspectiva que um dos maiores gênios da psicanálise, Jacques Lacan elaborou para a questão dos papéis familiares, catapultando seus arquétipos para longe da escravidão dos papéis de gênero e da atividade reprodutiva. Lacan ressalta a paternidade, maternidade e filiação enquanto função, nos possibilitando ver de diversos ângulos a equação familiar: um homem-mãe, uma mulher-pai, um filho-mãe, um pai-filha, uma mãe-filho são algumas das várias possibilidades nesta complexa e riquíssima trama de relações. Então vejamos:

Em virtude da falta de possibilidade de um portal dimensional ou uma máquina do tempo que nos teletranspotasse ao 1º século da “era cristã” podemos apenas imaginar, e talvez no auge de nossa inspiração sentir, a angústia pela qual passavam os apóstolos, fechados em seu próprio medo em uma certa casa de Jerusalém durante os 49 dias posteriores a crucificação de Jesus Cristo.

Não podemos sequer auferir com toda rigidez essa contagem de dias e datação, que pode estar muito mais ligada à construção de uma tradição da Igreja do que provavelmente a acuidade histórica. Mas deixemos a história comprovável (isso é possível?) para a obcessão dos historiadores. E pensemos na vivência eclesial que nos empurra para a frente em nossas vidas diárias. Abracemos a tradição da igreja, mas sempre com o devido cuidado de tradução da tradição.

A magna data de Pentecostes aponta para o início da formação de uma entidade familiar: a cristandade. Entidade familiar diversa, plural, muito longe da noção estereotipada que conduz a homongeneidade nuclear e burguesa de família. Nem tampouco sugere-se uma família de “agregados”, esfarrapada em si mesma e sem qualquer traço de coesão afetiva.

Família com propósitos claros: crescer e multiplicar seus componentes, sejam eles quem forem, venham de onde vierem, cheguem como chegaren. E para isso o derramamento do Espírito Santo vem acompanhado das línguas estranhas/estrangeiras (o original grego aponta para a idéia de OUTRAS línguas ao invés de demarcar o adjetivo do estranhamento) afim de que toda a diferença se expresse na inclusão. Inclusão da tenda verdadeiramente aberta, e não a da homofobia cordial das igrejas fundamentalistas, que recebem o diferente de braços abertos e algemas nas mãos.

A entidade familiar que o Espírito Santo confirma em Pentecostes tem suas portas abertas para fora, e não para dentro. Recebe quem entra mas convida a sair para o mundo, semeando a Boa Nova e anunciando o Querigma do Senhor. Não é a família-conforto, sentada no trono ou paralisada no triplo Sanctus angelical diante do Trono. O Espírito Santo exorta a entidade familiar por ele consolidada à intrepidez e a ousadia; à fronteira e não a demarcação de território.

Família dinâmica a que as línguas de fogo abrasam no dia cinqüenta: cheia de pais, mães e filhos mixados na proposta lacaniana da função dos papéis. Família revolucionária, instável e nem por isso frágil. O cristianismo, hoje religião que menos cresce no mundo (apesar da histeria integrista brasileira) só tem solução na entidade familiar chamada cristandade, que o Espírito Paráclito de Deus tornou possível, e na pluralidade apostólica que pode e deve ser resgatada em nossos dias atuais. O que nos unirá será então apenas a centralidade barthiana em Cristo, aquele que realmente importa, e que nos presenteou e ainda presenteia em Pentecostes com o fogo do Consolador.

Uma família complexa justamente porque marcada pelo mistério divino, (o tremendum sagrado de Rudolf Otto) que condiciona sua formação a ousadia da desconstrução do edifício do ódio ilustrado desgraçadamente em grande medida nos dias de hoje pela homofobia e incitação à violência; muitas vezes diretamente dos púlpitos pastorais, que não comungam da pulsão inicial do dia de Pentecostes, mas se dizem pentecostais.

Neste domingo celebraremos a entidade familiar que Pentecostes anuncia: uma cristandade para todos porque para todos veio o Senhor.

Ecclesia reformata et semper reformanda!

André Sena



“Betel: fé que pensa, razão que crê.”

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